Palavra do Especialista: Como a IA generativa pode auxiliar na formação médica? - Por Allan Pscheidt
Com inteligência artificial e metodologias ativas, formamos médicos mais preparados, humanos e adaptáveis às constantes transformações da saúde.
Olá pessoal! ❤️
Hoje, chamamos um especialista para discutir um tema essencial na educação: a personalização do ensino, com o apoio da inteligência artificial generativa.
O artigo do dr. Allan Pscheidt nos conduz por uma reflexão sobre como a tecnologia, especialmente a inteligência artificial, pode transformar a forma como médicos são formados.
Em um cenário onde o conhecimento evolui rapidamente, como equilibrar inovação e humanização? Quais os desafios e benefícios dessa abordagem?
Vamos explorar essas questões com a análise de um especialista no assunto.
Allan Pscheidt é inovador e especialista em educação, ciência e tecnologia, com Ph.D. em Biodiversidade e Meio Ambiente e MBA em Liderança e Inovação.
Com mais de uma década de experiência, lidera programas educacionais focados em metodologias ativas e aprendizagem criativa.
Allan é autor do livro Inteligência Artificial na Sala de Aula: Como a Tecnologia Está Revolucionando a Educação. Além disso, é comunicador científico, palestrante e mentor, com foco em temas como IA na educação, inclusão, diversidade e mudanças climáticas.
Como a tecnologia baseada em IA generativa pode auxiliar na formação de médicos?
Como educador e pesquisador, nos meus anos enquanto gestor de cursos superiores da área da saúde observo que a formação médica precisa considerar as transformações constantes das tecnologias, sem deixar de oferecer caminhos centrados na formação humanística. A aprendizagem personalizada neste contexto surge para valorizar diferentes ritmos, formas de estudar e trajetórias profissionais, algo necessário quando lidamos com estudantes de diferentes origens e histórias. Médicos em formação devem explorar seus interesses específicos sem perder o foco nas competências essenciais da medicina tocante ao processo diagnóstico e de cura de doenças.
As tecnologias educacionais disponíveis hoje permitem, de modo cada vez mais acessível, ajustar e monitorar o aprendizado. Plataformas on-line capazes de fornecer feedback imediato, por exemplo, potencializam a autonomia do estudante. Ao acompanhar relatórios de desempenho, cada pessoa identifica pontos de melhoria e de necessidade de reforço. Essa abordagem favorece não apenas a aquisição de conhecimento clínico, mas também a motivação para continuar avançando em conhecimentos mais desafiadores e específicos.
A aprendizagem personalizada, no ensino médico, significa ajustar a carga de conteúdos e práticas à medida que cada estudante evolui. Em vez de impor um ritmo único, como ocorre no ensino tradicional padronizado, é possível propor atividades e avaliações que considerem preferências, dificuldades e objetivos profissionais distintos. Essa flexibilidade é especialmente relevante em cursos, como a Medicina, que demandam o domínio tanto de teoria quanto de habilidades práticas.
Aqui entramos num tema bastante popularizado no último ano desde o acesso público de diferentes inteligências artificiais generativas. Se trata do ChatGPT, Gemini, Mistral, Claude, Perplexity, e mais recentemente o DeepSeek. Os modelos de linguagem em larga escala (LLMs) que correr nos bastidores dessas ferramentas em IA generativa são modelos robustos, treinados e disponíveis a um clique de distância (a maioria a dois cliques, passando primeiro pelo clique na assinatura…).
Ao integrar inteligência artificial e plataformas adaptativas, como na educação em saúde, observa-se melhora na retenção de conteúdos e no envolvimento do estudante. Pesquisas recentes comprovam que metodologias ativas, aliadas a sistemas de inteligência artificial, podem dinamizar o processo de estudo e reduzir lacunas de compreensão (Gilson et al., 2023; Eysenbach, 2023; Scherr et al., 2023; entre outros). Para mim, incorporar essas soluções exige não apenas infraestrutura, mas sobretudo uma formação adequada do corpo docente.
A pandemia da Covid-19 nos mostrou que dependemos principalmente de infraestrutura de dados, não de salas ou auditórios enormes. Mesmo os laboratórios podem ser atualizados com dispositivos de realidade virtual e modelos sintéticos digitais. No ensino, o aluno percebe a importância de um professor conectado e atualizado, não mais aquele que possui a maior bagagem de memorização de atlas de fisiologia ou patologia.
Durante o curso de Medicina, avaliações objetivas ajudam a verificar competências. Mas estudos de caso e de resolução de problema aproximam o estudante do futuro profissional. Quando alinhadas a sistemas personalizados, essas avaliações e estudos permitem elaborar relatórios de desempenho. Cada estudante entende seus desafios, como a análise de resultados laboratoriais ou a realização de procedimentos específicos. Esse feedback direcionado serve como uma bússola para o aprendizado, estimulando responsabilidade individual e foco nas áreas que demandam mais atenção. Percebe como o professor é liberado para procedimentos mais complexos e não fica preso a analisar individualmente constantemente cada um dos estudantes?
Desafios e Aspectos Práticos
A implantação de uma abordagem centrada na personalização do ensino enfrenta obstáculos. O primeiro é a mudança de mentalidade. Professores acostumados a métodos tradicionais podem questionar a flexibilização curricular ou a personalização de avaliações. Também a própria instituição e os processos regulatórios do Ministério da Educação.
Também demanda a formação continuada do corpo docente, a atualização de hardware e software, e um olhar para o currículo baseado nas habilidades reais que se espera de um profissional da medicina.
Infraestrutura também demanda investimento. Sistemas adaptativos necessitam de suporte técnico e recursos para seu funcionamento. Em turmas numerosas, pode ser desafiador manter a equidade de acesso, pois nem todas as instituições dispõem de condições financeiras para viabilizar o uso intensivo de tecnologia. Mesmo assim, quando há compromisso institucional, esses recursos tornam-se aliados para tornar o ensino mais inclusivo e efetivo. A longo prazo é uma situação de ganha-ganha.
Benefícios para Competências Clínicas
A personalização do ensino médico contribui para o desenvolvimento de competências clínicas e de comunicação. Ao integrar simulações e cenários interativos adequados ao nível de cada estudante, reforçam-se atitudes éticas e de empatia, além de promover vivência profissional realista. É possível praticar a anamnese, o exame físico e a tomada de decisão em ambientes virtuais, recebendo feedback imediato. Assim, o estudante evolui no momento em que o erro acontece, aprimorando o raciocínio clínico.
A experiência prática em hospitais ou clínicas apresenta limitações de tempo, número de pacientes e variedade de casos. Em grandes centros urbanos como na região metropolitana de São Paulo isto não é um problema, mas como promover a mesma qualidade de ensino e oportunidadedes numa região afastada? Ambientes virtuais ajudam a superar essa limitação, simulando diversas situações que os futuros médicos poderão enfrentar. Combinados com a IA generativa, conseguimos gerar imagens, vídeos, tornar mais real uma experiência geralmente encontrada apenas no formato de textos em livros. Ao acompanhar o progresso individual, orientadores detectam pontos fortes e fracos, ajustando o plano de estudos conforme necessário.
Análise de Dados e Melhoria Contínua
Ferramentas de análise de dados permitem compreender o percurso formativo. Ao identificar correlações entre estratégias de estudo e desempenho nas avaliações, docentes e coordenadores conseguem adaptar o currículo. Essa prática sistemática de avaliação resulta em melhorias constantes, reforçando o compromisso com a qualidade do ensino. Em vez de depender apenas de impressões subjetivas, conduz-se a formação médica com base em evidências. Diferentes IAs generativas conseguem analisar um grande volume de dados praticamente em tempo real, fornecendo feedback e apontando sugestões de ajustes que uma equipe docente levaria semanas ou meses. Dessa forma o currículo fica mais orgânico, centrado de fato no aluno e o professor, pois toda a carga de análise de dados e outros processos ficam a cargo da IA.
Conclusão
A aprendizagem personalizada se mostra compatível com os desafios de um mundo em que os conhecimentos se renovam rapidamente, no ritmo da globalização, mudanças climáticas e novas doenças e pandemias. Adaptar currículos e avaliações ao ritmo e às necessidades de cada estudante é uma forma de promover inclusão, equidade e qualidade de ensino na formação médica. A Inteligência Artificial aliada a metodologias ativas e à mediação docente, oferece oportunidades únicas para desenvolver médicos mais preparados e sensíveis às particularidades humanas.
Embora não seja simples, o resultado é gratificante: profissionais mais seguros, empáticos e capazes de enfrentar os desafios da prática diária. A partir de uma perspectiva inclusiva e centrada em evidências, a personalização afirma-se como via concreta para impulsionar a excelência na educação médica.
Referências para aprofundar a discussão:
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